Um quarto
escuro.
Para ele, um
cenário assim era praticamente o seu habitat natural. Preferia zonas de
crepúsculo onde sabia que podia esperar por acontecimentos não muito distantes
que lhe retirariam o tédio.
Para ela, um
quarto destes era ainda uma selva densa, território por explorar. Não tivera
nada disto antes, nem a escuridão do quarto, nem a escuridão da pessoa. Nela e
nos seus olhos claros havia de tudo – pequenos mundos repartidos por entre o
azul imenso, sonhos de caridade afincada e uma simplicidade que aprisionava
pessoas; havia tudo isto, menos tédio.
A cama era
preenchida por corpos díspares que se tentavam unir.
A cabeça
dela assentava no peito dele. A noite tinha sido longa para ambos, não tão
longa quanto ele estaria habituado nas suas jornadas de sangue, mas um longo
diferente, simples e necessário.
Ela
adormecia com sonhos límpidos e frágeis.
Ele não
dormia. As insónias eram um terror necessário, só mais um no meio dos muitos
que lhe enchiam o pensamento. Porém nem sempre eram terror, como hoje por
exemplo. O terror de não conseguir dormir, tornava-se do presente de a poder
observar, de conseguir sentir a sua respiração, de lhe dedilhar o cabelo
entrelaçando-o nos dedos ou de a beijar de leve para não a acordar.
O que ali
estava era tudo o que ela queria, mas a ela não enchia as medidas. Não havendo
segredos entre ambos, ela sabia dos horrores que se passam dentro dele e nas
noites em que ele não aparecia. Considerava-o um mal necessário. Compreendia-o
e isso, juntamente com a simplicidade que transbordada, o seu corpo e os seus
olhos, chegavam para o prender.
Hoje a noite
era só deles e ambos sabiam.
Ela não
dormia sozinha.
Ele não
acrescentava mais um corpo aos tantos que já faleceram nas suas mãos.
As noites
eram longas. E, por entre elas, apenas quando ela dormia é que se ouvia uma voz
forte a sussurrar:
- Amo-te.
Não como essas pessoas que andam de dia e de noite e falam da boca para fora.
Amo-te de verdade, como um louco, amo-te, como só os loucos sabem amar.
Sem comentários:
Enviar um comentário