sábado, maio 23

Vício

-Shhhhhh! Não fales. Não vale a pena.
E, assim, sucumbiram todas as ideias de gritar que ainda tinha. Ninguém a iria ouvir; não ali. E, mesmo que ouvissem que iriam fazer? Iria ser tarde de mais.
As lágrimas corriam pela cara fazendo sinfonia com alguns soluços de desespero.
Encontraram-se por acaso, ele e ela. Pelo menos ela pensava assim. Já ele, nada era acaso. O encontro fortuito no bar, este terceiro encontro, os sítios dos encontros. Os meios para chegar a este fim; nunca nada era por acaso para ele. 
Ela não era a primeira, as mãos já não davam para contar o leque de encontros acidentais que terminavam como este. Ela não era a primeira e, certamente, não seria a última. O vício era já maior que qualquer outro e sem desintoxicação possível. Era o cheiro característico, o perder da pulsação, o desvanecer, o petrificar do olhar e o calor virar frio incessantemente. Esta era a droga dele.
Agarrou o corpo dela contra o seu, colocando a sua boca junto ao ouvido dela. Respirou fundo, confortou-a - mesmo que não haja conforto possível – dizendo que iria ser rápido e que, talvez, nem sentisse. Mas ambos sabiam que isso era mentira.
-Shhhhhhhh! Descansa.
A faca atravessou-lhe o peito como um relâmpago em direcção ao coração.
Tinha terminado assim o encontro. Ela morta, no chão gelado, e ele drogado.
Este era o seu vício.
A sua droga.

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